CLAUDIO BARRETO VIANA

CLAUDIO BARRETO VIANA

O “CRAQUE” DA MANUTENÇÃO DA V ARIG

 

Aviação comercial brasileira veste luto

” Vivi na Varig por quase 40 anos, cercado por figuras inesquecíveis, mas poucas tão importantes, para mim, como o estimado  “Craque da Manutenção” – medalha de ouro nas minhas lembranças – a quem rendo aqui as mais sentidas homenagens”

 

Nos anos 60, quando se queria elogiar alguém,  o pessoal dizia- Aquele é “craque”. Eng. Viana, como ficou conhecido, em seguida ganhou a alcunha dos Famosos  –  “Craque da Manutenção.” Na Engenharia deitava cátedra. Representando a Varig nas  reuniões da IATA mostrava seu talento liderando as comissões sendo representante na aquisição e especificação técnica de vários aviões como Super Constellation, Boeing -707 e Convair -990 Coronado. Participou do programa de introdução dos aviões Super Constellation da Varig, tendo estagiado durante meio ano na fábrica da Lockheed em Burbank, California e na Lockheed  Aircraft Service, no aeroporto de Nova York.

Barreto Viana – O sorriso da liderança

Na Varig organizou   o  setor de compras de material, na então principal base da empresa em Porto Alegre. Foi ainda responsável pela manutenção de toda a frota internacional da Varig na capital gaúcha e em todas as bases internacionais da Varig. Como diretor – assistente de manutenção chefiou por diversas vezes a delegação da Varig nas reuniões de serviços e peças dos operadores internacionais de jato, realizadas em Londres, Rio de Janeiro, Roma, Nova York, Bruxelas e Paris, entre outras. Tais grupos decidiam a coparticipação de dezenas de empresas aéreas no uso de peças sobressalentes, valendo centenas de milhões de dólares Logo que assumiu suas funções na Engenharia da Manutenção, Barreto Viana, com nossa ajuda, criou normas específicas para desenvolver sua estratégia. Transferiu para a Engenharia o Controle de Serviços da Manutenção (CSM) que passou a funcionar 24 horas, em turnos de seis horas, feitos de forma revezada. Foi criado um imenso quadro negro, onde foi marcado o prefixo de toda a frota, agora com os três primeiros Super Constellation – PP-VDA, VDB e VDC  ficando exposta toda a vida dos aviões, com plaquetas marcando o voo efetuado, com suas escalas, horário, e aviões com seus serviços técnicos, troca de motores, hélice, revisão geral, voo de experiência e outras informações pertinentes, num amplo panorama . ajudando os Inspetores a tomar decisões, que antes só constavam em livros fechados

 

Sob o comando do engenheiro Viana, o Parque de Manutenção em Porto Alegre estava pronto para receber o Super Constellation

 

Cursando Jornalismo na PUCRS, a troca de horário foi um presente caído do céu. Por concessão dos colegas permaneci com horário fixo ( 06 às 12 horas). o que dava tempo para a Universidade na parte da tarde, e ainda completar estágio obrigatório no jornal até o fim da noite ,com  horas restritas para o sono reparador e estar desperto na madrugada do dia seguinte, rumo ao caminho da Varig ( perto de casa) de bicicleta. Como colaborador fui trabalhar no Diário de Notícias, na São Pedro, quase esquina da Farrapos, pertencente ao grupo dos Diários Associados comandado pelo famoso jornalista Assis Chateaubriand . Era tratado com simpatia e consideração pelo fato de pertencer a Varig, orgulho dos gaúchos por levar em sua sigla o nome do Rio Grande. Eu já fazia uma coluna chamada Torre de Controle, quando fui solicitado pela redação para faze matéria sobre a Semana da Asa. A matéria , versando sobre as instalações técnicas da Varig -“Na aviação comercial gaúchos são reis”,  (primeiro lugar, no Concurso patrocinado pelo V Comar) teve repercussão, inclusive na Varig, com manifestação calorosa de Berta. Em seguida fui chamado pelo engenheiro  Viana, recebendo congratulações pelo conteúdo da matéria,

Apoiado por ele, meu primeiro passo como jornalista na Varig, foi criar o Boletim Informativo de Manutenção. A pauta enfatizava o serviço executado em cada setor técnico, valorizando o desempenho dos seus competentes funcionários. Com a instituição do programa  “Boletim da Premio” foi amenizada situação que se fazia preocupante –  Havia certa resistência do pessoal de pista em consultar o Manual Técnico de fábrica, especialmente do Super Constellation, Em conversa com a diretoria sugeri a possibilidade de organizar um concurso com perguntas e respostas, que obrigava os mecânicos a manusear os catálogos em busca da solução. Entre os acertadores eram distribuídos valiosos brindes da Varig oferecidos pela nossa Propaganda  e sorteadas  duas passagens para Nova York, pelo Super Constellation, com programa turístico e visita às fábricas. retornando 7 dias depois. Foi um sucesso, com os objetivos plenamente alcançados. Graça a visão do Eng. Viana, passamos a editar ainda a  Rosa dos Ventos, uma revista interna que viria a ser a única na Varig, fato que resultou na minha transferência para a Propaganda, como Gerente Regional  de Marketing e Imprensa para o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná

Com a morte de Ruben Berta em 1966, Barreto Viana saiu da Varig para fundar a Aeromot Aeronaves e Motores, fabricante do motoplanador Ximango , que tive a oportunidade de criar todo o projeto de marketing nacional e internacional. Foi o primeiro motoplanador fabricado no Brasil, ganhando o nome de “Ximango” resultado de um concurso que teve a participação de mais de duas mil  pessoas, todas,  de alguma forma, engajadas no setor aeronáutico… O ganhador recebeu duas passagens para Paris, entregues no Programa  Atualidades – Domingo, apresentado por Clovis Duarte, na TV Pampa. Equipado com motor dispensando reboque por meios externos, o motoplanador Ximango, da Aeromot é a grande conquista da moderna tecnologia  aeroespacial  brasileira. Usado para reequipar aeroclubes, o Ximango é empregado também em voos de lazer e atividades econômicas. Com a fabricação do Ximango, a Aeromot passou a ser a primeira indústria de motoplanadores do Hemisfério Sul. Em 2007 Viana vendeu a Aeromot para um grupo de Belo Horizonte, que planeja montar uma fábrica no Estado.

Com a Aeromot, Barreto Viana fabricou no Brasil o motoplanador Ximango, de última geração , conquistando o mundo

 

Claudio Barreto Viana nos deixou, definitivamente (8/9/22) aos 90 anos, marcando uma trajetória assinalada pelo desenvolvimento que ajudou  a fazer da Varig uma companhia  singular pelo padrão técnico de manutenção e numa segunda fase dando vazão ao seu lado empreendedor construindo a Aeromot.

ADROALDO MESQUITA DA COSTA – UMA FIGURA LENDÁRIA  (Parte 3/3)

ADROALDO MESQUITA DA COSTA – UMA FIGURA LENDÁRIA  (Parte 3/3)

Segredos nunca revelados 

A queda de Getúlio  Vargas, em 46, representou o fim do regime totalitário do Estado Novo e a busca da democracia de eleições livres. Antes de recolher-se ao exilio voluntário na sua fazenda de Itu, no Rio Grande do Sul,, Getúlio havia criado o PTB, visando, estrategicamente, sua volta ao poder na primeira oportunidade –  o que viria a acontecer logo em seguida (1952) Impedido de participar do evento, indicou o Marechal Eurico Gaspar Dutra  para concorrer pelo partido, Existia grande afinidade entre ambos. Dutra havia – sido Ministro da Guerra, por nove anos, durante o Estado Novo. Junto, por indicação de Vargas, foi “encaixado” o advogado  Adroaldo Mesquita da Costa para ocupar o cargo de Ministro, da Justiça cuja credibilidade e capacidade profissional ultrapassavam fronteiras

Vencedor do pleito travado  contra o Brigadeiro Eduardo Gomes,, o Marechal Eurico Gaspar Dutra era  considerado, na política, cria de Vargas, de quem fora seu Ministro da Guerra por nove anos, durante o Estado Novo. Junto despontava a figura de Adroaldo Mesquita da Costa, como  Ministro da Justiça (1946/1950),figura historicamente ligada a Varig. Foi um período de crescimento do país, apoiado por norte-americanos, que encontraram a companhia gaúcha numa faze de afirmação, com a expansão das linhas e modernização da frota respaldada pela aquisição dos Douglas – DC-3 e Convair C-46  A  Varig viveu a implantação da Fundação dos Funcionários, dando a  Ruben Berta o comando da empresa como presidente, marcando o início de uma liderança inconteste, numa nova era voltada para a prosperidade.

Antes do exilio em São Borja, Getúlio criou o PTB, apoiou Dutra e indicou Costa e Silva como Ministro da Justiça. Estava montado o quadro para sua volta triunfal com o “queremismo” nas próximas eleições democráticas

O ingresso de Erik de Carvalho na Varig aconteceu um ano depois da minha admissão. Enquanto ele fazia dissidência na Panair, Mesquita da Costa ajudava Berta  a percorrer os caminhos nebulosos na conquista da congênere  –  Berta  enxergou à luz no fim do túnel e a Varig se deu muito bem com tudo isso Por sua vez, pouca gente sabia de que Adroaldo Mesquita da Costa, vinha a ser tio (por parte de mãe) do futuro presIdente, Costa e Silva, gozando por isso da intimidade das restritas decisões. Era personagem respeitada e historicamente envolvida com a existência da Varig e seus interesses através dos tempos. Dentro do governo militar tinha trânsito livre, deixando as portas abertas para Berta – (sem trocadilhos) Convidado por Castelo Branco assumiu o cargo de Consultor Geral da República, função que exerceu de 1964 ate 1967., acompanhando a polêmica entre Varig x Panair. Berta não tomava qualquer decisão política mais arrojada sem o aval do Consultor da República.

Detalhe decisivo nunca revelado na mídia – Adroaldo Mesquita da Costa era tio, por parte de mãe, do futuro presidente Costa e Silva – Portas abertas para Berta

.Mesquita da Costa manteve aproximação com os militares. No governo de Eurico Gaspar Dutra fora chamado para colaborar assumindo o Ministério da Justiça sendo considerado unanimidade por sua sabedoria jurídica .Ele era de família religiosa, praticante respeitado no âmbito da Igreja Católica desde se 1933 , quando defendendo a LEC -Liga Eleitoral Católica .Esse lado do seu perfil foi importante no movimento de 1964 (embrião da revolução), sendo ligação entre o Governo Militar e os membros da Igreja Católica participando da “Marcha pela família com Deus pela liberdade” em manifestação popular que reuniu  nas ruas do Rio de Janeiro um milhão de pessoas, contra o governo esquerdista de Jango. Junto ao Governo Federal patrocinava encontros e  eventos envolvendo o líder da Varig com a presidência da República; Com Castelo Branco não foi diferente. A aproximação com o presidente  era fundamental para os destinos da  “Pioneira.”

Sempre que havia encontro com figuras marcantes, presidentes, governadores, políticos, Adroaldo levava Berta e com ele o magnifico CTG Pagos da Saudade, formado por funcionários da Varig, que tinha no início o acompanhamento do folclorista Paixão Cortes Foi o caso da recepção prestada pelo presidente Castelo Branco, tendo como de costume a presença de Adroaldo Mesquita da Costa, intermediando o encontro e repassando ao presidente um mimo oferecido por Berta A escolha da Varig em substituição a Panair foi um jogo político realizado em vários capítulos, e por razões diversas onde a figura de Mesquita da Costa quase sempre se fez presente. Ele não escondia sua admiração por Ruben Berta: “Um verdadeiro patriota. Homem sem ambições maiores, a não ser o fortalecimento da organização que liderava”

Adroaldo promovia encontros da Varig com governantes e levava Berta à tiracolo com o CTG dos funcionários , que encantava com seu folclore gaúcho

Sem a presença de Mesquita da Costa dificilmente a companhia gaúcha, mesmo sendo exemplo de eficiência técnica e qualidade administrativa, não teria alçado voos tão altos, Em fins de 64, a Varig buscou financiamento para adquirir mais alguns aviões intercontinentais capaz de reforçar suja frota visando  o aproveitamento para futuros voos na Europa, um sonho idealizado por Berta. O pedido foi negado por um banco norte-americano que comunicou ao governo brasileiro de que a Panair fizera solicitação semelhante para a compra dos DC-8 e até o momento não tinha honrado o compromisso. deixando de pagar as parcelas acordadas no contrato.

Esse fato, a partir de janeiro de 1955, quando o  Brigadeiro Eduardo Gomes assumiu o Ministério da Aeronáutica, fez com que o governo viesse a controlar de perto a vida da Panair. Teve então inicio um processo investigativo com os resultados repassados ao presidente Castelo Branco, tal era a gravidade dos fatos. Preocupado com a situação da aviação comercial no pais, Eduardo Gomes reuniu um grupo de militares de alto nível para discutir o assunto e achar solução compatível com o grau de dificuldade que o assunto exigia. Um dia depois, segundo relato que me fez Harry Schuetz, foi solicitada a presença de Berta e do presidente Ribeiro |Dantas, da Cruzeiro, para uma reunião cercada do maior sigilo O encontro realizado no Ministério da Aeronáutica foi coordenado por Eduardo Gomes, tendo participado ainda um grupo de militares altamente credenciado. Ficou claro, após uma exposição de motivos, que a situação da Panair era insustentável e seriam tomadas medidas drásticas, coisa recebida sem contestação pelos presentes. O assunto foi imediatamente levado ao conhecimento do presidente Castelo Branco, confirmando  a decisão do seu colega de farda, sem restrições. Segundo palavras textuais do brigadeiro, a não aceitação da proposta pela Varig de assumir as linhas da Panair, representava a implantação  da Aerobras, coisa que aterrorizava Berta.

Na saída, o presidente da Varig trazia no rosto  a surpresa da decisão favorável que lhe concedia a concessão tão sonhada e a reponsabilidade de ser a única empresa de bandeira da aviação comercia brasileira, detalhe que alterava seus planos. A tarefa exigia de Berta  algo acima do imponderável – esperava dividir os encargos entre duas empresas de bandeira ( com a própria Panair) Agora, teria que absorver uma congênere esfacelada, com dividas impagáveis e administrar um grupo de milhares de colaboradores, preocupando a sua inclusão nos conceitos da Fundação dos Funcionários, numa integração conturbada de administrar. Era um doce abacaxi a ser saboreado mordendo a casca, sem quebrar os dentes.

Berta e Castelo Branco O sorriso da escolha única, virou preocupação

A morte prematura de Berta, foi um golpe que a Varig custou a digerir.  Mais uma vez a figura do anjo salvador apareceu  como balança equilibrando a dor da perda  irreparável, No féretro, colocando palavras sabias de acalento, deu mensagem de esperança e resignação :- A beira do tumulo foram prestadas significativas homenagens-  Na derradeira saudação,  Adroaldo Mesquita da Costa, Consultor Geral da República e um dos fundadores da Varig, finalizou com uma frase lapidar – “Berta foi um homem genial  que enobreceu a raça humana.”

Junto ao túmulo a frase lapidar proferida por Mesquita da Costa deixou gravada em letras de ouro a imagem de Ruben Berta

Na Assembleia do Colégio Deliberante, logo após o falecimento de Berta,  (dezembro de 66) coube ao dr.Adroaldo a leitura da mensagem deixada por Berta, como que antevendo uma despedida, pregando união entre o grupo declarando que seu sucessor, Erik de Carvalho, estava pronto para assumir os destinos da Varig. A passagem do bastão, como não poderia deixar de acontecer, coube mais uma vez a Adroaldo Mesquita da Costa, figura certa que sempre norteou a Varig nos momentos cruciais da empresa, seja de imensa alegria ou profunda tristeza.

Na posse, Erik de Carvalho recebe o abraço de Mesquita da Costa, em nome dos membros do Colégio Deliberante, atendendo os presságios de Berta.
Adroaldo Mesquita da Costa foi distinguido pelos seus pares para ler a mensagem que Berta havia preparado instantes antes de sua morte, ainda na mesa de trabalho, no Rio de Janeiro. Nela o presidente antecipava certezas e dificuldades.
Helio Smidt , último presidente histórico da Varig e Adroaldo Mesquita da Costa (91 anos) – encontro derradeiro de dois ícones na metade dos anos 80
Fundação Ruben Berta – A proposta de Erni Silveira Peixoto é aclamada de pé pelos membros da Assembleia, trazendo momento de profunda emoção. A lenda eterniza o nome.

 

ADROALDO MESQUITA DA COSTA

ADROALDO MESQUITA DA COSTA

Com Meyer – Salvando a Varig do extermínio ( Parte 2/3)

“Convocarei a Assembleia Geral, dissolverei a Varig e em manifesto ao Rio Grande do Sul, darei as razões do meu procedimento.”

A Varig desenvolvia sua atividades rotineiras de uma empresa aérea pioneira, até o ano de 1930, quando iniciaram os movimentos revolucionários em nosso Estado.. A 24 de abril de 1930, quando Oswaldo Aranha se encontrava à frente da Secretária do Interior do Rio Grande do Sul e preparava a revolução deflagrada a 3 de outubro, firmou  contrato com a Varig, em nome do Estado gaúcho e em que ela foi representada pelo diretor  presidente, Sr Otto Ernest Meyer e seu diretor – técnico, Walter Peschel.

Flores da Cunha era o Interventor Federal do Estado – dependia dele o “canetaço” da vida ou morte da Varig.

Ao ato se encontrava presente o dr Francisco Campos, secretário do Interior de Minas Gerais – na ocasião o contrato estipulava de que o governo cederia, pelo prazo de 20 anos, com opção para mais 20, o campo de Gravataí para uso e administração da Varig, fornecendo recursos financeiros no montante de 399.000$000 para o acabamento deste; a construção de um hangar e respectivas instalações essenciais, e finalmente lhe poria à disposição até 186.000 dólares, para que lhe adquirisse 4 aviões terrestres de passageiros do tipo Junkers-F-13, – 2 aviões de correio e carga e 2 e outros 2 para instrução, mediante a entrega de 1.050 de suas ações. assumiria a construção de outros 6 aviões e manteria uma escola de aviação, onde seriam matriculados, anualmente, a título gratuito,  até 10 alunos da Brigada Militar.

Meyer e Adroaldo – Um abraço do tamanho da história que ambos construíram juntos

Deflagrada a Revolução a 3 de outubro de 1930, seguiu Oswaldo Aranha para o Rio de Janeiro, a fim de ocupar o Ministério da Justiça, enquanto Flores da Cunha assumia a Interventoria  Federal no Estado. Posteriormente, a Varig buscou o cumprimento do contrato junto ao Interventor Federal, encontrando sempre muita dificuldade. O próprio Oswaldo Aranha escreveu para Flores uma carta, que entre outras coisas afirmava categoricamente: “Seria um crime desamparar a Varig, Flores, quando o seu reerguimento está em tuas  mãos e ela reclama do Governo apenas o cumprimento de um  compromisso. No fim do mês corrente se reunirá a Assembleia dos credores e ela será obrigada a desaparecer se o Estado não  acorrer em seu auxilio. Estou certo que não permitiras que isso suceda, e assim sendo, terás o teu nome ligado a mais um ato de justiça e benemerência”.

Foto histórica nos 25 anos da Varig – reunindo a cúpula da empresa. Na primeira fila, nas extremidades, as figuras sagradas de Otto Ernest Meyer e Adroaldo Mesquita da Costa. No fundo, Ruben Berta – o passaporte para o mundo.

Entretanto, nada modificou a situação. Em 1ª de outubro de 1931, o major Alberto Bins renunciou a presidência do Conselho Fiscal, cargo que passei a ocupar. Como havia nesse espaço todo de tempo ocorrido propostas e contra – propostas de ambas as partes, sem que nada ficasse resolvido, enviamos a 19 de outubro um ofício ao Interventor tentando uma pronta solução e pedindo uma resposta até o dia seguinte à noite, Terminado o prazo previsto e dado nenhuma resposta, escrevi um bilhete ao General Flores da Cunha, com a seguinte declaração: ” Se dentro de 24 horas, a Varig não receber o que lhe é devido, convocarei a Assembleia Geral, dissolverei a Varig e em Manifesto ao Rio Grande do Sul, darei as razões do meu procedimento. Deixei a carta no Palácio aos cuidados do senhor João Antunes da Cunha, após dar-lhe ciência do conteúdo e voltei a casa. Imediatamente o telefone tocou. Era o senhor Antunes que, em nome do Interventor, pedia o meu comparecimento imediato à sua presença. Larguei o fone e dirigi-me ao Palácio, pois morava numa grande casa na rua Riachuelo. ao lado do Solar dos Câmaras.

O Flores da Cunha cumprimentou-me visivelmente agastado, e a mim se dirigiu nestes termos: “O senhor é um caso sério para o meu governo”. Ao que lhe retruquei de imediato: Eu não, a Varig talvez”. E prosseguiu: “Que quer oi senhor de mim? Respondi-lhe::”:Mas este contrato não tem nenhum valor jurídico?” Contestou- me Era necessário que a Assembleia o tivesse aprovado  e ela foi dissolvida, sem que tivesse pronunciado a respeito. Isso na opinião de V. Exa, respondi-lhe: “para mim o Estado tem obrigação de cumprir o que trata” – Ademais, prosseguiu Flores da Cunha, esse processo que o senhor se refere. não está comigo.”,  Obtemperei – me “Estou informando que encontra-se nos seus aposentos, para onde foi remetido.

Personagens marcantes no crescimento da empresa, na época pioneira, receberam de Berta o reconhecimento da Varig, com a cessão do Passe Livre (agosto de 1950) como o conferido ao dr, Antonio Augusto Borges de Medeiros, pelos relevantes serviços prestados a organização

“Comigo? indagou-me surpreso? Eu, confirmando a informação, ele mandou chamar o João Antunes da Cunha e dele indagou  o paradeiro do processo. Informado de que realmente o documento se encontrava em seu quarto, de como havia declarado, que o mesmo fosse trazido  à sua presença, Ao recebê-lo, entregou-me com estas palavras : Vai ter com o Maciel. Ele que o examine e decida.” No mesmo instante dirigi-me à Secretaria da Fazenda, para relatar ao dr. Francisco Antunes Maciel tudo quanto ocorrera. Após o parecer do Procurador Fiscal, dr. Carlos Heitor de Azevedo,, meu saudoso colega de turma, foi-me, então, transmitido pelo dr. Maciel Junior o almejado despacho – ” Pague-se” Ao restituir-me o processo disse-me sorrindo: “Agora vê se consegue a assinatura do Flores. E, eu, felizmente, a obtive. Assim a Varig pode continuar a existir.

No dia seguinte a empresa recebia do Estado 1.200 contos de réis. Dias depois assinava novo contrato com o Governo  Em 11 de novembro por designação do Secretario da Fazenda, o Major, Alberto Bins,  era nomeado Fiscal do Governo junto a empresa .Em 1932, em Assembleia Geral foi determinado que enquanto fossem vivos, teriam passagem gratuita na Varig .por relevantes serviços prestados a aviação comercial brasileira, nomes consagrados como Flores da Cunha, Major Alberto Bins, João  Antunes Maciel, Oswaldo Aranha e dr, Borges de Medeiros. Para surpresa minha fui incluído nessa relação.

(Parte 3/3)- Com Berta – Informações sigilosas e a aquisição da Panair

ADROALDO MESQUITA DA COSTA

ADROALDO MESQUITA DA COSTA

UMA FIGURA LENDÁRIA

Do pioneirismo aos anos dourados da Varig (Parte 1/3)

Em função da minha atuação como jornalista na Varig tive a honra de  usufruir do convívio com o dr. Adroaldo Mesquita da Costa, figura influente  e decisiva na história da Varig. Quando iniciei a editar o Boletim do Museu Varig, logo em seu segundo número, em 1979, fiz uma entrevista que ficou gravada nos anais do pioneirismo da aviação brasileira. Nasceu daí um relacionamento que me deu subsídios para entender e conhecer em detalhes o que foi  a empresa que ele ajudou a  fundar, juntamente com Otto Ernest Meyer, criando, como advogado, os Estatutos da Varig, que nortearam a constituição definitiva da companhia, em 1927. Depois, “com o andar da carruagem” como ele afirmava, considerado os desdobramentos que deram o comando a Ruben  Berta e Erik de Carvalho, manteve – se sempre ligado à Varig, até sua morte, na véspera de completar um século de vida (1885/1985)

No pioneirismo, ajudando Meyer a construir o sonho de criar a Varig

Eu já o conhecia antes, mas não tão de perto, e já admirava sua postura e facilidade de comunicação. O dr. Adroaldo, (como todos nós, respeitosamente, o chamávamos), era uma pessoa fascinante. Dominava a oratória de uma forma mágica. Iniciava seu discurso falando calma e pausadamente. A medida que avançava no desdobramento do assunto suas frases tornavam-se repletas de posturas retóricas e o tom aumentava progressivamente, contagiando a todos. O silêncio era absoluto e no final os aplausos brotavam tomando conta da plateia.

Sempre que havia na Varig um evento com a presença de autoridades convidadas, o dr. Adroaldo era escalado para falar, dividindo o palanque com Berta. Na verdade, além do presidente, a Varig, não tinha nem um dos seus diretores com aptidão para discursar em público, situação provavelmente, originária da castração do próprio comando da empresa. Era certamente uma figura carimbada do meu álbum de atrações, já contemplado para entrevista no segundo número do Boletim do Museu. Nesse primeiro encontro ele atendeu o convite e solicitou que o fosse visita-lo  em sua residência. Então, me contou coisas espetaculares, que para meu gáudio  logo repassei ao meu público alvo.

Nos Anos Dourados, com Berta, – baluarte das grandes conquistas

” Em 1927 eu morava na rua da Ponte, número 1228, numa casa alugada em que pagava trezentos réis.-  num belo dia me aparece o sr. Otto Meyer. do qual eu havia sido advogado um pouco antes para fazer um contrato entre ele e seu primo. O negócio referia-se  ao escritório de representações que ambos abriram nos altos do Mercado Público. Nesta ocasião ele me falou objetivamente: “Olha. dr. Adroaldo, eu pretendo fundar uma empresa de aviação aérea aqui no Brasil. Fui piloto aviador na Alemanha e lutei na guerra até fins de 1918”. O Meyer contou sua história de como veio para o Brasil e como amava esta terra. Falou-me, detalhadamente, como queria formar a empresa aérea. Consultou-me , então, sobre a legislação vigente na época. A lei brasileira sobre o assunto havia sido feita há três anos antes, e eu, naturalmente, estava em jejum na legislação, porque a Varig foi a primeira empresa aérea criada no Brasil. A conversa prosseguia. Ele então me disse que pretendia colocar, primeiramente, uma linha de Porto Alegre a Pelotas e Rio Grande. O capital seria de 1000 contos de reis, divididos em ações de 200 réis cada uma.

No Museu Varig, o templo da história, a amizade entre nós ganhou força

Na oportunidade, Meyer me contou que havia recebido um grande incentivo do major Alberto Bins, prestigiado político na época. e Arthur Bromberg  entusiastas da aviação,  reuniram o capital de 1000 contos de réis. entre a colônia alemã e italiana do Estado. Com esse capital comprou-se dois hidroaviões  – O  Atlântico e o Gaúcho. Prosseguindo a nossa historia – “neste tempo, em 1927, o Carlos Maria Bins havia se formado e veio trabalhar comigo. Eu e ele concluímos os primeiros estatutos da Companhia  em pouco tempo. Várias reuniões preliminares eram realizadas nos escritórios da Casa Bromberg e feita a Assembleia Geral á 7 de maio de 1927, fundou-se oficialmente a Viação Aérea Rio Grandense. “Eu não era nada da empresa, apenas um advogado iniciante”

A constituição definitiva da Varig, expressa nos seus Estatutos, passou pelo talento do jovem advogado

VARIG VIROU CARNIÇA PARA URUBUS A PARTIR DE DECISÃO GOVERNAMENTAL

VARIG VIROU CARNIÇA PARA URUBUS A PARTIR DE DECISÃO GOVERNAMENTAL

 

Como Lula e Dilma foram citados no imbróglio

Para o deputado Paulo Ramos que investigou e presidiu o chamado “Caso Varig”  (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), o evento reuniu uma série de crimes praticados por todos os envolvidos no processo de compra e venda da Varig e da VarigLog. Para ele a Varig,  na época, a partir de uma decisão governamental. se transformou numa grande carniça em torno da qual os urubus se organizaram com o objetivo de obter lucro fácil,

Em depoimento prestado no  CI ( Comissão de Inquérito)  Denise  de Abreu,  ex –  diretora da Agência Nacional de Aviação Civil ( ANAC) órgão que regula a aviação comercia no pais, confirmou denúncias de que havia sido pressionada pela ministra Dilma Rousseff da Casa Civil da Presidência da República, para beneficiar o grupo  Matlin Paterson  na operação da compra da Varig. .Ela também acusou o compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o advogado Roberto Teixeira de ter praticado tráfego de influência ao usar o nome de Lula para “abrir portas” e assim beneficiar o grupo  Norte -Americano

Denise também informou que Roberto Teixeira pressionou a ANAC  para dispensar os três sócios brasileiros, Audi, Gallo e Haftel de apresentarem documentação comprovando a capacidade econômica financeira deles. Pela legislação  brasileira 80% do capital aportado em negócio envolvendo  companhia aérea brasileira,  deve ser nacional. Os três chegaram a ser acusados de atuarem como ‘laranjas” sendo afastados da direção da VarigLog por acusação de gestão temerária,

Comandante diz que que a venda da Varig foi uma fraude. Ao depor na quarta-feira (09/07/2008) na Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI), o presidente da Associação dos Pilotos da Varig (APVAR) comandante Elnio Borges Malheiros, classificou de fraude a venda em  2006, da companhia aérea VARIG para a VARIG LOG (empresa logística e transporte de cargas ) controlada pelo fundo de investimentos  norte – americano MATLIN PATTERSON, junto com três sócios brasileiros- Marco Antonio Audi, Luiz Gallo e Marcos Haftel. Segundo os três brasileiros eram apenas  testas –  de – ferro reunidos na VOLO DO BRASIL

Para o comandante Élnio a operação da venda foi apenas  “‘entrega graciosa” de uma empresa brasileira a um grupo estrangeiro, o que é ilegal. Ele chegou a garantir aos senadores que, atualmente, “ninguém sabe quem são os verdadeiros donos da Varig e quem está atrás do fundo norte -americano Matlin Patterson” O comandante também estranhou  não ter havido, por parte do governo brasileiro, – incluindo o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva – apoio para que os funcionários da Varig, em conjunto com a Lan Chile, pudessem adquirir a empresa, apesar das garantias do pagamento  da dívidas trabalhistas e tributárias orçadas em R$ 7 bilhões A justiça, mesmo assim, observou ele ,deu preferência ao grupo Matlin  Patterson que não honrou a divida.

Instado pelo líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), o comandante classificou de “infelizes” as intervenções do governo no processo de compra e venda da Varig e da VarigLog. Para ele o governo em nada ajudou a Varig a se recuperar, mas apenas abriu caminho para a realização de um bom negócio Segundo Agriipino, a Varig foi vendida para a VarigLog por U$$ 24 milhões. Oito meses depois, acrescentou, a empresa foi vendida a Gol por U$$ 320 milhões. Sem a presença na reunião do representante da base do governo, o comandante Élnio chamou de “farça” o plano de restauração da Varig. Como exemplo, afirmou que até agora nada foi pago aos ex-funcionários e que o Fundo de Pensão Aerus “está destruído” Durante o depoimento,  o comandante  denunciou o que chamou de processo de desestruturação das companhias aéreas brasileiras. Segundo ele, tanto a Gol como a TAM “vão muito mal das pernas” Élnio garantiu que as empresas nem sequer suportam uma inspeção séria.

* Matéria liberada pela Agência Senado (.09/07/2008)

PADRONIZAÇÃO DA FROTA

PADRONIZAÇÃO DA FROTA

A solução que Berta idealizava e não teve tempo de realizar

Uma frota única representava milhões de dólares em poupança.

Um super hangar foi construído em 1955 para abrigar o Super Constellation e dar condições para a equipe de manutenção realizar um serviço de alta tecnologia.

Com os aviões comprados diretamente da fábrica pela primeira vez  em 1955, Berta vislumbrou o caminho para uma frota mais homogênea com infraestrutura de hangar especialmente construído e pessoal técnico com treinamento específico aumentando a qualidade de serviço . O sonho, no entanto, durou pouco. Logo depois do Super Constellation  chegaram o Caravelle e o Boeing -707 , todos construídos por fábricas diferentes, agravando ainda mais o problema  da padronização.

O Caravelle, com apoio do presidente Juscelino, deu para a Varig o pioneirismo da era do jato no Brasil

A Varig crescia – Berta tentava unificar a frota mas as circunstância  não favoreciam. Por uma série de dificuldades pontuais nem sempre as aeronaves disponíveis, incluindo a negociação, eram do mesmo fabricante. A concorrência avassaladora não dava tempo para esperas. Era pegar ou largar. E o sonho da igualdade da frota, com equipamentos da Lockheed, Sud Aviation e Boeing, além de outros fabricantes, ficava cada vez mais distante. Nem sempre querer é poder. Berta sabia que uma empresa com frota padronizada representava incrível avanço operacional. Poderia concentrar conhecimentos e capacidade técnica em um único equipamento. reduzindo tempo de treinamento e mão de obra simplificando as tarefas.. A tripulação e o pessoal da manutenção poderiam operar com muito mais eficiência e qualidade. Haveria uma acentuada redução  do número de peças estocadas nos almoxarifados. O serviço da pista ganharia em agilidade.

Berta e o Boeing – 707 / Jato que mostrou ao mundo o melhor serviço de bordo e uma manutenção impecável alavancando uma trajetória vitoriosa

Com voos para o exterior teriam reduzidos os trabalhos nas bases, diminuindo  a necessidade de manter gente especializada para cada tipo de equipamento, tudo com peças, motores, hélices e turbinas sobressalentes, gerando um custo extravagante dada a diversidade de material. Concentrar conhecimento e capacidade de mobilização em uma frota única representava milhões de dólares em poupança, objetivo  que Berta perseguia mas não conseguia atingir. Ficava entre a cruz e a espada. A Varig tinha pressa para crescer Precisava enfrentar a modernidade da concorrência. Correr riscos era a solução mesmo sabendo da dificuldades. Não  havia tempo hábil para vacilação. No entanto a padronização da frota  tornou-se cada vez mais complicada. Na era Berta a Varig utilizou dezenas de aviões de fabricação diversificada, o que sempre dificultou seus ganhos na área internacional.

Sorriso encabulado de Berta na frente do Electra – avião inicialmente rejeitado pelo presidente que se tornou um ícone na historia da nossa aviação

Em 1966 a companhia tinha sete aviões de três tipos de células e três tipos diferentes de turbinas, além da diversidade existente na frota doméstica. resultado da absorção da Real e da Panair. Alguns dias antes da morte prematura de Berta ( dezembro de 66) ele garantiu em documento em nosso poder que  “a empresa só se curará desse mal quando fixar a padronização para dois tipos de jatos ou possivelmente de um a  três tipos de aviões domésticos, em lugar dos sete hoje existentes, coisa prevista para acontecer em meados de 1968, quando inclusive a empresa espera abrir mão das subvenções do governo brasileiro”. 

Com o ingresso do Convair 990 A e sua modernidade, a Varig completou um ciclo que a consagrou como líder na América Latina, apesar das dificuldades da falta de padronização da frota nos anos 60
Historinhas do Museu Varig

Historinhas do Museu Varig

BERTA E O MEDO DE VOAR EM PLANADORES

 

Para os pilotos  brasileiros, em aprendizado, voar em Planador era encontro com deuses – 

Para Berta não era tudo isso.

Finalmente,  Berta mostrou seu ponto fraco depois de voar no Biguá e fazer  pouso forçado –   num misto de raiva e pavor – “Onde diabos vocês foram arrumar um cabo tão vagabundo?” Depois deu dor de barriga e ele nunca mais quis  voar em Planador – coisa que não acontecia na formação dos pilotos  brasileiros. Para eles, voar de Planador era um encontro com os  deuses.- para Berta nem tanto.

Planador Gaivota , em primeiro plano, era atração no Museu Varig

 Segundo  Dinis Campos, primeiro secretário da VAE, me revelou em entrevista para o Boletim do Museu, Ruben Berta voou  uma só vez no Biguá sob o comando de Ruhl. Logo na primeira curva a menos  de 100 metros de altura, o cabo do reboque quebrou, Graças a perícia do piloto, o planador passou entre uma árvore e uma casa e pousou numa faixa de terreno baldio. Depois deste acontecimento Berta nunca mais quis saber de Planador. Num grande esforço de toda a equipe de colaboradores, em especial com a ajuda do colega Jaime Meneghini o Biguá foi recuperado, assim como o Gaivota, tempos depois, colocado em exposição no teto do Museu, tornando-se uma das maiores atrações do local. O avião que foi construído em 1938, na VAE, ficou notabilizado entre outras peripécias, pelas demonstrações que fez na Parada da Mocidade e nas comemorações do Dia do Aviador. No entanto, ele serviu, especialmente, como instrumento de formação para treinar  inúmeros pilotos, que chagaram a tripular os modernos jatos da empresa.

Ruhl e Dinis Campos, com comandantes recém formados, tendo ao fundo o Planador Biguà

A formação dos pilotos  brasileiros era uma exigência do governo do Estado, então o maior acionista da Varig. Com os planadores construídos na VAE, Otto Meyer deu início a grande aventura. Logo  que foi criada a Varig procurou  formar pilotos brasileiros. Existia uma preocupação por parte de Meyer neste sentido. Com a organização da VAE ( Varig Aéreo Esporte) em 1937, após Carlos Ruhl haver realizado diversos cursos na Alemanha, a empresa passou a divulgar a viação desportiva com o uso de planadores construídos em suas próprias oficinas,

Na formatura de mais uma turma, contando com a presença de Otto Meyer (de branco) um grande incentivador da VAE

O Gaivota e o Biguá marcaram  época, participando de diversas apresentações públicas. Com o Biguá eram feitos diversos voos de propaganda e passeios com autoridades, convidados especiais e imprensa. Ruhl fez as mais lindas acrobacias que já havíamos visto, O Interventor Federal , Cel. Osvaldo Cordeiro de Farias, voou no Biguá, recordado por ele  “como uma das maiores sensações de sua vida” Em 1943 o Ministro Salgadp Filho também gozou dos prazeres do Biguá.

COCHILO REPARADOR – DORMIR ERA DESPERDICIO PURO

COCHILO REPARADOR – DORMIR ERA DESPERDICIO PURO

O dia era pequeno para tanta ousadia.

 

O cenário dos anos 60 foi rico em figuras notáveis como Ruben Berta, sempre pioneiro com sua Varig, já pensando em dar a volta ao mundo  – Assis Chateaubriand, ampliando o reino da comunicação com os  Diários Associados inaugurando o advento da televisão no Brasil e Juscelino Kubitschek, construindo em tempo recorde o milagre de Brasília introduzindo no Pais a era da modernidade definindo, na somatória das forças, a obstinação dos vencedores

Eles guardavam características. Assemelhavam-se, transformando  ideais em metas para serem alcançadas.. Qualquer cochilo era suficiente para revigorar forças e manter olhos bem abertos, não importando tempo e espaço, para, fazer acontecer o impossível, – palavra que para eles não existia no dicionário. Cada sonho era uma premonição.

Berta quase não dormia à  noite – uma permanente insônia. Muitas vezes, em plena madrugada, acordava e pedia para dona Wilma fazer sanduiches e surpreendia os mecânicos nos hangares revisando aviões que iam sair  pela manhã. Acompanhava o trabalho Dava palpites e confraternizava. Para ele não tinha hora perdida. O tempo valia ouro  e cada instante merecia ser vivido com intensidade. Fez da Varig. uma pequena companhia do interior do Rio Grande a maior empresa aérea da América Latina.

Assis Cheteaubriand, envolvido com o sucesso da televisão não tinha hora certa para invadir a redação atrás da notícia que buscava afanosamente – como que um prato de comida nordestina que engolia com enorme prazer. alimentando as edições do seu Diários Associados. No lugar que estivesse, fosse onde fosse, fazia um dos seus portentosos escritos. Envolvido em  mil e uma atividades ( inclusive com o MASP. Museu criado por ele em São Paulo do  qual a Varig -diga-se Berta – era transportadora participativa) Chatô considerava-se um ser extra terrestre, com o resto da humanidade regurgitando aos seus pés. O sono ficava para depois, quando aparecesse, sorrateiramente, com resultado  pífio logo transformado em poeira.

  Juscelino, gravou seu nome na história com a construção de BRASÍLIA  dentro do  Plano de Metas definido pelo slogan  que caracterizou  o movimento – “ 50 ANOS EM 5″ – numa amostragem da velocidade necessária para cumprir seu desiderato, obrigando o presidente a se desdobrar ao máximo, junto com sua equipe de técnicos e os “candangos com suas dificuldades de relacionamento. JK. ficava insone dois a três dias seguidos, para acompanhar os trabalhos que não paravam e discutir com a equipe técnica o andamento da obra, que a oposição chamava de “monstrengo.” Seguidamente era flagrado por câmeras indiscretas, vencido pelo ardor das batalhas diárias, derrotado pela exaustão  que lhe consumia, mas logo refeito pelo ânimo revigorante do seu inquebrantável ideal  Depois de concluída ( 1955/1960),  BRASÍLIA viria a tornar-se  uma das construções mais notáveis do mundo.

Entre Brasília e Rio de Janeiro – cortesia Varig sem pesadelos

O trio vigoroso tinha muita coisa em comum,. desde a forma de tomar decisões antecipando-se  aos fatos. Líderes autênticos eram personagens fantásticas nos seus acertos e erros. Verdadeiras máquinas de pensar e buscavam objetivos que somente iniciativas arrojadas poderiam contemplar. Tomados por grande agitação pelo que fazer, o dia parecia para cada um girar além das 24 horas dos simples mortais. Dormir era desperdício. Viviam acesos o tempo todo  só  parando derrubados pelo cansaço. Não  escolhiam momento e nem lugar para caírem  em um cochilo reparador. Era o descanso do guerreiro do qual ninguém tinha a coragem de perturbar.

AGROBRÁS E A FUNDAÇÃO

AGROBRÁS E A FUNDAÇÃO

BERTA – O REI DO GADO E MUITO MAIS

A revolução de 64 finalmente varreu do cenário a ideia da AEROBRÁS. Antes, .premido pelas circunstâncias, Berta passou a diversificar as atividades da Fundação criando novas oportunidades de trabalho para seus funcionários. No início dos anos 60 a aviação comercial brasileira vivia uma séria crise, dependendo cada vez mais dos favores do governo federal. Esse quadro, alimentado pela existência da Petobrás, Eletrobras e outros institutos estatais, fazia com que o movimento prosperasse em favor da Aerobrás, deixando Berta e o pessoal da Varig em grande tensão.  Apesar do otimismo do ingresso dos jatos, Berta chegou ao ponto de planejar e por em prática a criação  da Agrobrás, usando verba da Varig  e da  Fundação dos Funcionários, crente que estava perto um enlace negativo. Era um novo negócio, do qual  tinha amplo conhecimento (convidado para ser Ministro da Agricultura.no governo Juscelino) capaz de ser alternativa de sobrevivência para todo o grupo tal a delicadeza da situação . Berta chegou a temer pelos  destinos da Varig, no episódio de 63, em pleno governo de João Goulart.

Para se precaver de possível intervenção a  Fundação passou a investir pesadamente em outros ramos de atividade, incluindo pecuária com granjas e fazendas, destacando-se a criação de gado holandês importado do Uruguai, adquirido para implementar o povoamento do campo. O objetivo era a instalação de uma indústria de laticínios  capaz de atender as necessidades de consumo nos armazéns da Fundação e nos serviços de bordo da empresa. Havia plantação de soja, trigo e milho, tudo aproveitado para uso interno,  No inicio de 1966, Berta buscava implementar a avicultura através do aumento da produção da carne de corte ampliando o sistema de granjas, iniciativa que já acontecia em Porto Alegre e São Paulo.  Esperava  criar um novo núcleo no Sítio de Agua Preta, próximo a cidade de Recife, a fim de abastecer o Norte. Com o programa procurava colocar a carne de aves no mercado por ser mais barata do que a do gado. -“aumentando as possibilidades de alimentação protéica do nosso povo  ensinava. ele.

As seleções  eram conduzidas na Granja Yatil em Porto Alegre, de propriedade da Fundação, sob  a competente direção do dr. Jorge Abreu, do Ministério da Agricultura. Neste mesmo ano, no mês de dezembro, Berta veio a falecer, não tendo ocasião de ver concretizados seus planos nesta área. O projeto, no entanto, teve continuidade na gestão de  Erik de Carvalho. Os adversários de Berta chegaram a acusá-lo de desviar dinheiro das subvenções governamentais para engordar outros tipos de negócios,. obrigando os funcionários a investirem como acionistas, buscando segurança para enfrentarem um futuro incerto. Quem quisesse ter seu próprio negócio ( desde que não fosse no transporte aéreo) fora da empresa. não era molestado e representava uma atitude de precaução. Muitos colegas chegaram a ter outros negócios paralelos. que eram tocados por sócios ou familiares, sem nunca serem molestados. A nossa família, por exemplo, comandada por meus filhos,(Doca e Beto), teve pizzaria chamada Espaço Aéreo, com layout  tendo a Varig como tema, (anos 80). Considerada o “templo da aviação” com um  serviço e qualidade do produto que encantava.

VARIG – NOS TEMPOS DE HELIO SMIDT

VARIG – NOS TEMPOS DE HELIO SMIDT

Um presidente de corpo e alma

Até a minha saída da Varig, depois de quase quarenta anos de serviço, convivi  com todos os presidentes históricos. Um deles, no quesito “gente”  foi Helio Smidt, com quem tive um relacionamento  pessoal e profissional, intenso. Ocupando o cargo de gerente regional  de propaganda e imprensa e depois diretor  e um dos fundadores da  Expressão Brasileira de Propaganda, Agência do grupo, sempre que ele vinha ao Sul eu o recebia no aeroporto junto com a diretoria, quando era definida estratégia para o encontro com a mídia local, interessada em saber das novidades da marca Varig, então uma expoente na aviação  mundial. Na época, os mais importantes órgãos da imprensa brasileira tinham  sucursal em Porto Alegre,  e qualquer novidade virava notícia nacional, as vezes com repercussão no exterior. Hélio Smidt tinha um carisma pessoal,  personalidade cativante. Era atencioso com todos mantendo  uma postura de  gentleman .A vitória mais simples ele comemorava como uma conquista  –  quando bolou um guardanapo especial anexado num dos botões do  vestuário do passageiro, brindou com o pessoal de bordo, mandando acrescentar no cantinho da peça HS bordado

Helio Smidt quando presidente da Varig, fez sua última aparição pública em Porto Alegre. no Palácio do Comercio, dissertando sobre a aviação comercial e a modernização da frota da Varig.

 

Ele  ingressou na Varig aos 19 anos como auxiliar de escritório, convidado pelo seu tio (Ruben Berta) na época presidente da empresa, Teve que abandonar seu emprego na Nestlé onde tinha iniciado aos 13 anos de idade permanecendo  por 7 anos,  para aceitar o  convite ganhando 170 mil reis (salário mínimo na época) Recém chegado a empresa recebeu a missão de viabilizar economicamente a pioneira linha aérea que ligava Porto Alegre à cidade de Rio Grande. Sem carga para carregar no voo de retorno, o jovem chefe do departamento de vendas imaginou transportar filé de lingado congelado para capital gaúcha.. A iniciativa obteve êxito e com ela uma carreira promissora
Mais tarde, Smidt sentiu-se naturalmente tentado  a seguir uma carreira como piloto, mas foi surpreendido por Berta tendo de interromper o curso. Transferido para o Rio de Janeiro, em 1946,foi para São Paulo em 1950. onde morou por 18 anos. Após12 anos do seu ingresso na companhia em 1957, assume o cargo de diretor regional e, em 61, galga ao posto de diretor de administração do conglomerado formado com a aquisição da Real Transportes Aéreos e outras empresas de menor ´porte. Posteriormente acompanhou  a incorporação das rotas da Panair, com os aviões da Varig assumindo os voos para a Europa, num prazo de 24 horas.
O afastamento de Erik de Carvalho vitimado por um derrame cerebral, levou Helio Smidt à presidência da Varig em abril de 1980, época que o setor da propaganda e imprensa   manteve-se em evidência com a criação da Expressão Brasileira de Propaganda. Eu atendia o Setor Sul englobando  além do Rio Grande do Sul, minha sede, Santa Catarina e Paraná . Assim como  acontecia aqui, sempre que o presidente se deslocava para qualquer  dos dois estados vizinhos eu estava presente, acompanhando seus passos, coisa que gerou admiração mútua mais intima entre nós, até amizade..   Certa  vez, ele foi conduzido para ser entrevistado num canal de televisão em  Curitiba. Antes, dei um panorama da situação da capital  sob vários aspectos, anotando nome dos entrevistadores e outras coisas mais. Como eu esperava  ele deu conta do recado de forma brilhante. No final, quando entravamos no hotel ele pediu minha opinião. Na  verdade foi excelente, argumentei: “apenas um pequeno detalhe foi esquecido – num evento dessa magnitude responder com mão no bolso não é o melhor comportamento” e caímos os dois em gargalhadas. Fatos, assim, demonstravam o grau de intimidade que se criou entre nós, como um time bem treinado que sabe jogar em conjunto..

Na época eu editava a Revista Espaço Aéreo de minha propriedade sem prejudicar atividade na empresa. Ao contrario, servia como bandeira nos interesses da companhia o que somava pontos junto a direção e colegas. Especializada em aviação e turismo nunca teve concorrência nos 20 anos que existiu O assunto abordado, pela sua relevância , mereceu capa, que por sua vez deixou o presidente entre surpreso e encantado. Em seguida , no estilo Berta, num dos seus famosos bilhetinhos. expressou sua satisfação – “Prezado Albuquerque- Grato pelo “tiro” disparado em tua última edição e principalmente pela foto que até eu mesmo desconhecia. A reportagem está ótima e bastante ilustrativa. Excelente mesmo. Meus parabéns em nome de vocês todos. Meu obrigado e abraço” Hélio Smidt

Mesmo eleito presidente, ele achava tempo para  confraternizar, especialmente quando o evento reunia membros do Colégio Deliberante da Fundação  O pessoal de São Paulo organizou um torneio de futebol sete (Taça da Amizade) para inaugurar a cancha  no Recreio Chuvisco. O nosso time era muito bom e derrotou paulistas e cariocas. No final houve agradável confraternização. Helio  fez questão de entregar o troféu de campeão, que coube a mim receber, como capitão do time gaúcho, Outro momento que marcou nossa amizade, aconteceu em Porto Alegre, na festa da comemoração dos meus 35 anos de Varig, junto com demais colegas agraciados  pelo mesmo motivo. O diretor regional, Erni Peixoto, se movimentou para participar da entrega do diploma, e um distintivo de lapela mas quem veio ao nosso encontro (Geny estava comigo) foi o presidente e sua esposa, dona Norma  – ele  fazendo sinal para o colega segredando – ” Esse é meu”

Voltando a morar no Rio de Janeiro  ele descobriu que sofria de câncer. Então iniciou uma série de  viagens aos Estados Unidos a fim de  buscar tratamento. Ao invés de  passar  seus dias de folga ( ele continuava trabalhando) podendo usufruir qualquer grande capital do mundo, preferiu o balneário de Imbé, onde havia passado os dias inesquecíveis da juventude. A família  adquiriu bela casa  fronteira ao “Lago Morto” que recebeu o nome de Hélio Smidt,(ainda em vida) numa homenagem merecida, iniciativa da Prefeitura Municipal  prontamente atendida.Quando assumiu o comando da Varig, nos anos 80, Smidt logo buscou por em prática um plano de modernização da frota, dando continuidade a direção que estava sucedendo… Apesar de enfrentar sérias dificuldades, pela política vigente no país, conseguiu vencer obstáculos quase intransponíveis, alcançando seu intento. – implantou no Brasil a era do jato com a aquisição do espetacular  Boeing 747 – 300,( maior jato comercial do mundo) e revigorando a frota com os notáveis  MD-11 e 767 – 300. chegando a nível de excelência. Modernizou o equipamento  da Cruzeiro  e da Varig com a introdução do Airbus, oferecendo excelente padrão de conforto aos passageiros

Após exatos 10 anos na presidência da Varig, em 11 de abril se 1990, a doença o vitimou aos 64 anos. Faleceu no Memorial Sloan-Kettering Hospital, em Manhattan. Seu corpo foi trazido ao Brasil num DC-10-30 da empresa. Seus restos  mortais, numa última  viagem entre os aeroportos de Guarulhos e Congonhas, foram transportados por um Electra, seu avião preferido