Colocar o pé numa Loja da Varig no exterior era como entrar na própria casa
As lojas da Varig no exterior ficaram famosas pelo atendimento e requinte. Todas estavam localizadas em pontos mais importantes nas capitais onde a Varig operava. Em Paris, ficava em plena Avenida Champs Elysées e a de Nova York instalada na Rochefeller Center. Os clientes consideravam o local mais importantes do que o Consulado, capaz de receber ajuda imediata dos seus problemas e inquietações. Transformada em ponto de encontro para intermináveis conversas. Era um pedaço do Brasil incrustado em terras estrangeiras.
Seja a bordo de um avião da Varig ou em uma das suas lojas espalhadas pelo mundo, era como por um pé no solo pátrio. O visitante sentia-se obsequiado com o mais puro cafezinho brasileiro tendo à disposição jornais e revistas atualizadas, como Manchete e O Cruzeiro. Muitas vezes esqueciam de remarcar a passagem, tendo de retornar no mesmo dia (com novos encontros)
Um anúncio de página dupla publicado na revista de Bordo Ícaro, mostrava a grandiosidade da nossa loja de passagens em plena Rochefeller, confessando o prazer de receber.
Na parte superior a manchete abria com um convite – PODE ENTRAR A CASA É NOSSA ! No final do texto vinha uma frase que definia todo o conceito da companhia – A VARIG NÃO FOI FEITA SÓ PARA VENDER PASSAGEM!
Outros meios de transporte espalhavam boatos denegrindo a concorrência do avião
Com o advento do avião terrestre e a expansão dos voos para o interior do Estado, Meyer e Berta tinham a difícil missão de mostrar ao público a importância deste novo meio de transporte na economia regional. Havia quase que um desconhecimento sobre a eficiência do avião. A segurança do voo era contestada, com a participação sorrateira da concorrência de outros meios de transportes, que viam nas vantagens do avião um forte adversário a ser batido. Assim, era voz corrente que uma pessoa idosa não podia voar pois teria problemas com o coração. .Falavam da existência de um grande buraco no ar e do perigo das tempestades. Tudo teve que ser contestado, numa campanha promocional de folego, que durou cerca de dez anos, até a chegada dos modernos DC – 3 , robusto e aprovado como transporte de guerra.
Demonstrando um conhecimento fantástico sobre o mais pesado do que o ar, em um dos anúncios divulgados, Berta respondia, item por item, a todas as dúvidas existentes, na maioria descabidas. A manchete era significativa – Tens medo de voar? Logo após seguia o texto – ” Afasta -os da tua mente, porque não são justificados. Lê com atenção o que segue, raciocina e faz uma experiência. Serás, como muitos outros, um amigo inseparável da aviação.
A atmosfera é como um oceano -Sustenta o avião como o mar sustenta o navio. A velocidade faz alcançar uma densidade igual a da água.. Para te convenceres deste fato coloca a mão fora da janela e sentiras a enorme resistência que existi. Esta resistência, que sempre está presente, é uma garantia de segurança absoluta.
O buraco é uma lenda – Como não existe na água, não existe na atmosfera. Esta, na proximidade do solo, fica agitada em consequência de correntes aéreas verticais, ascendentes ou descendentes, segundo o poder reflexivo da superfície terrestre em relação ao calor solar.
A velhice não impede a viagem aérea – Altura não prejudica o coração .Ninguém se priva de ir a Serra, cujos lugares de veraneio estão localizados a maior altura do que a do voo do avião
Não existe vertigem de altura – A terra, quanto mais alto se voa mais se assemelha a um mapa geográfico, numa beleza incomparável. Ninguém sente sensação de altura.
Não é o motor propriamente que sustenta o avião no espaço. – Sua função consiste em dar velocidade ao corpo e às asas promovendo a formação de um vácuo na parte superior destas, que mantém sugado o avião.
Fala sobre as tempestades e termina afirmando: “Os comandantes são profissionais experientes, exercendo a aviação diariamente em qualquer circunstâncias e tempo, percorrendo centenas de milhares de quilômetros sem nenhum acidente. Que garantias maiores podes exigir? – VARIG: A primeira fundada no Brasil e que mantém desde a sua constituição, tráfego aéreo com 100% de segurança..
Na busca da concretização da imagem, quando completava 18 aos de existência, a Varig publicou um folheto super criativo, impresso a cores, usando formato de bolso, em , duas dobras, valendo-se de sugestiva chamada – SUA VIAGEM AÉREA NÃO É UMA AVENTURA. Nele, Berta mostrava todo o complexo que envolve uma companhia de aviação. “É uma organização de pilotos super preparados, de mecânicos de manutenção completos em sua qualificada profissão, de meteorologistas, conhecedores do tempo, atento as suas mudanças, despachantes, de auxiliares de tráfego, de contabilistas e dirigentes progressistas e muitas outras pessoas, num trabalho de equipe com lealdade profunda com sua companhia. Reforça, ainda, o anúncio anteriormente publicado, usando agora a chamada “Desfazendo Impressões”, voltando a abordar novos itens, como – “Todos os aviões modernos dispõem de rádio – goniômetro, aparelho que indica o destino ao piloto, independente de visibilidade exterior. Nos aeroportos há radiofarol. Informava, ainda – que o trafego nas linhas é organizado mediante altura diferente de voo para cada avião. As descidas nos aeroportos são dirigidas pelas Torres de Controle, de modo a evitar choques de aparelhos em pleno ar.
O enfrentamento contra a concorrência desleal, ficou claro quando a Varig exibiu um novo folheto, nos mesmo moldes do anterior, que abordava o tempo de viagem de avião comparado aos demais meios de transportes, com a sugestiva chamada – VALORIZE SEU TEMPO – Serviço Aéreo – Aí, entra de sola e faz um comparativo entre o avião e os demais meios de transporte e dá de goleada – Modernos bimotores com velocidade de 300 km por hora e um corpo seleto de funcionários, garante-lhe um serviço insuperável em conforto, rapidez segurança e atenção individual, afirmava Berta. O grande diferencial garantia expressivo ganho de velocidade, capaz de reduzir, significativamente, o tempo gasto em cada viagem. Enquanto o avião saindo de Porto Alegre, levava apenas três horas para alcançar Montevidéu, outros transportes precisavam de 56 a 72 horas para cumprir o trajeto. Uma viagem para Pelotas demorava de 12 a 14 horas pelos meios e transporte convencionais, enquanto o avião ocupava apenas 45 minutos. Santa Vitória, por exemplo, o avião gastava apenas pouco mais de duas horas, enquanto outros meios precisavam de 45 a 96 horas. Significava uma diferença incrível.
Os folhetos da campanha tinham os textos escritos por Berta, sendo diagramados e impressos na Livraria do Globo, em Porto Alegre. Neste, ele argumentava ser o avião fator de sucesso, com ganho impossível de ser recuperado na vida e nos negócios, tornando-se precioso auxiliar para transportes de pessoas, bem como para o despacho de encomendas, correio e valores. No texto Berta garantia: “Não creio que seja mais caro do que outros meios de transporte,. o é apenas na aparência. Aos valores da passagem de trem, ônibus ou vapor, devem ser incluídas as despesas de condução, alimentação, gorjetas, roupa estragada e a absoluta diferença de tempo gasto, coisa que somada dá incrível vantagem para os bilhetes aéreos.
No pós guerra, em 1946, a Varig se debruçou na grande oportunidade oferecida pelos aviões norte-americanos, que inundaram o mercado como os Douglas DC-3 e os robustos Convair C-46, provados em guerra. A aviação ganhou definitivamente status de segurança e credibilidade e a Varig estava pronta para viver um novo mundo.
História da primeira mulher a comandar os jatos da Varig e da Emirates
Pela primeira vez, nos 65 anos de existência da Varig, uma mulher se formava na disputada e rigorosa Escola de Aeronáutica da empresa Tempos atrás imaginar uma mulher pilotando um avião comercial deixava muitos homens machistas, de cabelo em pé.
Rompendo barreiras de décadas passadas, a Varig permitiu que mulheres realizassem exame de seleção para ingresso na EVAER (Escola Varig de Aeronáutica) o que anteriormente era privilégio masculino. A solenidade de formatura da 25ª turma da EVAER aconteceu em 22 de maio de 1992, tendo como Patrono da turma Anésia Pinheiro Machado, primeira aviadora voar solo no Brasil. Com um nome do tamanho da sua grandeza, Kalina Yeda Cox de Barros Dias, tornou-se a primeira mulher piloto da linha aérea da empresa.
Ela havia ingressado na Varig em 1986, como comissária de bordo, mas seu coração pulsava para voos mais ambiciosos. Já na infância, em Recife, trocava bonecas por aviõezinhos. Voar era uma paixão antiga, que vinha de uma família muito brevetada – o pai e o irmão já eram pilotos, assim como o esposo, comandante Silvio Teani Comenho, também da Varig. Kalina Cox, como gosta de ser chamada, teve uma carreira brilhante na Varig. De primeiro Oficial, nos 15 anos que permaneceu na empresa, atingiu todos os degraus da profissão no comando dos modernos jatos da companhia gaúcha.
Com as dificuldades que atingiram a Varig em 2006, Kalina alçou voou para os Emirados Árabes, sendo contratada pela Emirates. onde foi, também, a primeira mulher piloto da linha aérea da empresa, sendo a primeira mulher em comandar o Boeing- 777.da companhia; um gigante para 400 passageiros pesando 300 toneladas. Depois de 10 anos na Emirates, Kalina mudou-se para a América do Norte, com marido e filha, onde montou uma empresa de recrutamento de pilotos. Junto com aviadoras brasileiras fundou a Associação das Mulheres Aviadoras do Brasil ( AMAB) reunindo as pioneiras do grupo Varig em 1998, sendo presidente de honra..
Nos anos 70, nosso Departamento de Propaganda buscou resgatar a figura-símbolo do Tucano, criado por Francisc Petit (53) através do cartaz que recebeu premiação internacional. Para valorizar a figura, então com o advento da televisão, o personagem ganhou corpo e alma. e o turismo doméstico foi contemplado. com a campanha – Conheça o Brasil pela Varig de uma maneira inusitada e altamente criativa.
A figura e as músicas do Tucaninho são lembradas até os dias de hoje, graças a qualidade do trabalho e a grande repercussão que alcançou apoiado por generosa estratégia de comunicação. O público-alvo passou a ser gratificado com memoráveis filmes para a TV tendo como suporte, a divulgação de jingles com as músicas através do veiculo rádio em todo o Brasil, que começou a contar junto ( especialmente o público infantil com quem a Varig sempre dedicou especial afeição) com excelente retorno para os negócios da companhia.
Ao todo foram sete filmes espetaculares, cada um destinado a locais específicos, fazendo o garoto propaganda voltar a cena com muito charme, visitando as grandes capitais do país. Ele dançava conforme à música. Aparecia vestindo a roupagem tradicional de cada região. No Ceará, por exemplo desfilava cantarolando, com chapéu de cangaceiro dançando o Xaxá ; no Rio Grande do Sul, o tucaninho se transformou num autêntico gaúcho, pilchado, como manda a tradição. A música caiu no gosto popular sendo cantada nos bailes de carnaval com incrível entusiasmo
O criador das imagens do Tucaninho para a Televisão foi Delcio Pereira, que teve passagem brilhante pela Varig. Atuou no Departamento de Propaganda e na agência Expressão. durante 26 anos, numa trajetória de sucessos que o consagrou como cartazista e designer. Foi dele a criação de todos os personagens para o tucaninho. Junto com Messina (Jingles) visitavam os Estados colhendo informações fidedignas para o trabalho. Delcio também criou as personagens dos mais espetaculares sucessos da Varig na TV, como Seu Cabral ( Portugal), Uraschima Taro (Japão.) além da figura do Variguinho, personagem infantil amiguinho das crianças e a revista em quadrinhos .que levava o nome da personagem. Para a revista de bordo Icaro, considerada uma das mais importantes do gênero no mundo da aviação, deu sua genialidade nas ilustrações e diagramação
A história de um dos maiores ícones da publicidade brasileira (1-2)
A vitória do então desconhecido Francisc Petit num grande concurso de arte organizado pela Varig, fez nascer em 1953 uma figura lendária na propaganda brasileira. Segundo Meio e Mensagem o jovem Petit, recém chegado ao Brasil, conseguiu emprego na agência Publicine, tornando-se em pouco tempo, graças, ao seu talento, o encarregado do estúdio de arte. Lá, ficou ao par de um concurso de cartazes da Varig, cujo regulamento e busca de ideias, tomaram-lhe noites e dias até encontrar o mote que traduzisse a Varig como uma companhia aérea no Brasil – um tucano de camisa listrada ,óculos escuro, chapéu da palha e vara de pescar. Esse era o fagueiro olhar catalão sobre o país que Petit vivia há pouco mais de meio ano.
A preparação do cartaz, relatada detalhe a detalhe por Petit em 1991 – ou seja quase 40 anos depois – é uma verdadeira aula de capital cultural, indicadora também do perfeccionismo, que faria a diferença. -” Mandei fazer dois bastidores e um quadro, como dos quadros tradicionais, com madeira boa, mogno. Comprei uma folha de papel alemão Schuellerhammer para guache. Umedeci cuidadosamente o papel, que estiquei e preguei no bastidor. Quando secou ficou um lido tambor sem nenhuma dobra ou ruga, liso, perfeito. Era assim que todos os cartazistas europeus apresentavam seus trabalhos. Nesse fabuloso bastidor de papel, executei meu cartaz com guache, copiando o pequeno esboço que tinha feito. Desenhei o personagem “Tucano”, o céu azul cobalto, o avião Constellation passando ao fundo, o lettering da Varig e a marca, tudo num só original belíssimo.
Os melhores publicitários, artistas e cartazistas do Brasil tinha participado desse grande concurso, mas, pelo resultado, nenhum havia captado o espírito brasileiro da Varig, como “um tal de Petit” – essa foi a resposta que a moça da recepção da agência da Varig da rua Barão de Itapetininga deu a Petit, quando o garoto de 19 anos foi até lá informar-se sobre o vencedor do concurso – a moça lamentou – “Pena que o ganhador esqueceu de deixar o endereço”, conta Petit. – Quase morri de emoção. “Foi algo inexplicável, maravilhoso, que jamais esquecerei”.
Naqueles idos de 53, na reportagem do jornalista da Folha de São Paulo, Caversan (2003) o Tucaninho da Varig não só rendeu a Petit um bom dinheiro como fama abrindo-lhe as portas da maior agência de publicidade do Brasil, a J.W Thompson. Em janeiro de 2000, quase meio século depois, o mesmo Tucaninho da Varig daria a Francisc Petit outro raro privilégio: o de ser o único brasileiro incluído em famoso catálogo americano sobre os maiores ícones do séc XX. O Tucaninho foi também o único personagem brasileiro citado no livro What a Character, lançado nos EUA. O catálogo mostra os maiores ícones da publicidade do século 20, como o tigre Tony da Kellog’s e o camelo Joe – Camel 50.
Dentro de um novo quadro histórico, em 7 de maio de 1930. o major Alberto Bins, presidente do Conselho Fiscal da Varig, declarou, oficialmente, o desinteresse da empresa em prosseguir nas negociações da fusão com a Condor.- por falta de prazo conveniente. A diretoria e o Conselho Fiscal da Varig. haviam procurado novos meios para defender os valores da companhia. Ele garantia, ainda, ter recebido valiosa proposta do governo, que visava apoiar moral e materialmente a companhia para manter-lhe a independência buscando o bem dos interesses da população do Rio Grande. Assembleia resolveu, por unanimidade, não mais tomar em consideração a fusão com a Condor. A dissolução do negócio estava na devolução dos hidroaviões, venda do imóvel do aeroporto na ilha Grande dos Marinheiros e compra de 41% das ações pertencentes a Condor, além do encontro de contas até a data da Assembleia. O movimento revolucionário foi, certamente, a razão da intervenção do governo impedindo o desaparecimento da Varig.
Por trás dessa decisão, existia uma boa história para contar. A fusão proposta pela Condor acabaria com a Varig, já no seu primeiro ano de vida. Só, que um insólito acontecimento viria colocar agua fria na fervura. Enquanto as tratativas avançavam dentro da proposta de operação conjunta, Meyer envolvia-se, secretamente, em uma grande conspiração política visando a derrubada do Governo da União, presidido por Washington Luis, considerado fraudulento. Nas eleições, a contagem dos votos deu a Vargas uma vitória esmagadora aqui no sul. No entanto, no cômputo geral, o grande vencedor foi o candidato Júlio Prestes, coisa nunca aceita pelas lideranças gaúcha e mineira. Havia sérias suspeitas de que o governo central teria condições de manipular ao seu bel prazer o resultado das urnas, considerando a extensão do pais e inexistência de um controle absoluto na contagem dos votos. Faltava uma formula perfeita para garantir a integridade do pleito.
Em outubro de 1929 sugiram no Rio Grande do Sul tentativas visando o levante político liderado pela Aliança Liberal tendo no topo as figuras de Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha e Flores da Cunha, nomes tradicionais da política local, a quem a Varig devia tudo, pela apoio e esforço na sua criação. Envolvido com a conspiração pelo chamamento de Oswaldo Aranha, a fusão projetada pelas duas empresas começou a vazar. O governo do estado tinha sido, até então, um mero espectador no processo da fusão .Mudou radicalmente a sua postura ao assumir o perfil revolucionário. Muitas vezes, Meyer passou a manter encontros secretos com Osvaldo Aranha na residência deste, no bairro Tristeza, em Porto Alegre, onde a conspiração continuava a ser tramada. Instruções eram repassadas para Meyer e Berta, que assumiam posição relevante na estratégia do uso da aviação como arma bélica, coisa que o governo revolucionário não podia dispensar.
Atendendo determinação de Oswaldo Aranha, Meyer apresentou um parecer sobre a orientação a ser dada ao serviço de aeronáutica nos âmbitos civil e militar, ficando afeto àquele a preparação e cuidado do material e a última ação puramente militar.. No setor civil Carlos Sylla foi escolhido como diretor geral e Walter Peschei como diretor técnico. Ruben Berta assumiria a seção de tráfego e Otto Meyer pela Intendência.. A Varig participou ativamente incluindo contrato feito em 1930, cedendo o piloto Nuelle e avião. Quando se aproximavam as eleições de 1º de março de 1930, Oswaldo Aranha procurou conseguir por intermédio da Varig dois aparelhos que servissem para transporte de pessoas e permuta de informações no dia do pleito. Em meados de fevereiro foram tomadas as providencias para a aquisição de dois aviões Klimam, que serviriam para o fim almejado. Meyer assim o fez colocando-os montados no campo de Gravataí, prontos para qualquer eventualidade.
Todos que trabalharam pela revolução foram heroicamente dedicados, afirmava o documento. Entregaram-se com ardor a tarefa de organizar a arma da aviação, buscando a maior eficiência possível. Graças a Revolução Liberal a Varig continuou viva.
A parceria escondia um segredo compartilhado com Meyer
Ao completar um ano a Varig ainda engatinhava e a Condor achava-se pronta para “dar o bote“.-
Documentos dos arquivos secretos de Meyer, liberados pela família quando das pesquisas para o livro” Berta os anos dourados da Varig,” mostram os detalhes que salvaram a Varig do extermínio, quando ainda dava os primeiros passos. A proposta feita pela Condor, através da Lufthansa, quando a Varig comemorava seu primeiro ano de existência, dá ideia do oportunismo e da verdadeira razão que levou o grupo alemão a ser o grande parceiro na criação da companhia gaúcha, em maio de 1927.
Queria engolir a Varig e fincar suas raízes, definitivamente, no sul do Brasil. Os alemães articulavam fazer uma fusão com a pequena Varig, contando com a maior receptividade dos acionistas da empresa gaúcha e do próprio Otto Meyer, seu criador, No relatório da diretoria Meyer não poupava elogio à Condor. Em 10 de maio de 1928, esta mesma assembleia resolveu aceitar por unanimidade as propostas e as condições formuladas pelo Syndikat para a fusão de ambas as empresas, no mais tardar dentro de um ano.
Certamente, Meyer havia conseguido a adesão e o apoio da Lufthansa e do seu governo, por um acordo que introduzia o grupo alemão no Brasil através de uma participação acionária (que trazia por trás uma fusão como pano de amostra para domínio imediato) Meyer em seu encontro em Berlim, simplesmente ignorou a participação da Condor, exigindo um documento com o timbre da Lufthansa. Ele tinha jogado todas as fichas na mesa, culminando com a certeza de uma união a curto prazo, decisiva na negociação costurada por Meyer
Ele, considerava impossível manter-se sem a fusão com uma companhia de porte internacional, buscando expandir seus interesses no tráfego aéreo da mala postal da Europa para a América do Sul e vice-versa.. Sem esta negociação fundar uma companhia do nada, era um negócio desinteressante, que somente um objetivo maior poderia representar sua adesão.
Os alemães entrariam na sociedade com apenas um hidroavião,(Atlântico) já usado, carecendo de grandes revisões, e logo em seguida com outro hidroavião (Gaúcho) bajulando com o nome, na intenção de quem veio para ficar, (aumentando sua participação no lote acionário que passou de 25% para 41%,quase chegando lá.) Os hidros davam seus últimos suspiros considerados descartáveis em pouco tempo ( quase sucata) quando o futuro estava nos aviões terrestres, com possibilidade de amplo raio de ação, usando pistas espalhadas nos locais mais estratégicos e importantes do pais, sem ater-se, exclusivamente, a geografia do litoral (onde as pistas já estavam prontas)
A Lufthansa, em parceria com o governo alemão, oferecia, através da Condor, mão de obra especializada que estava ociosa e era o seu diferencial de qualidade. No início, todos os pilotos e técnicos de manutenção eram alemães. A Condor, que passaria a ser apenas um departamento da Lufthansa buscando serviço na América do Sul, vendendo aeronaves, ajudando a criar empresas, oferecendo pilotos e mecânicos para operá-las, cumpria seu papel. Como o dinheiro na Varig era curto e construir pista era inviável no momento, a oferta ficou com os hidroaviões, num pais de extenso litoral. .
No Brasil o objetivo maior, nunca revelado explicitamente, era assumir o controle sobre a Varig, da qual já possuía quase a metade das ações sem investir dinheiro vivo. Tudo leva a crer que Meyer pactuava do mesmo desejo, pois já havia deixado escapar numa entrevista ao Correio do Povo, das dificuldades de manter uma empresa desse nível sem o apoio de uma grande organização, com experiência mais moderna como era o caso da Condor -. “Fatalmente. mais cedo ou mais tarde, será ela consumida pela concorrência de um grande grupo internacional ou por alguma outra sociedade nacional, aliada a um desses grupos”, garantia ele.
O apoio dado ao desconhecido Meyer, além da relativa garantia dos compatriotas radicados no pais, embutia o fato de que a vida da Varig teria os dias contados, tratando-se logo da fusão das duas empresas, para em seguida ser transformada numa nova companhia, com outro nome e outras ambições, tendo a Lufthansa e o governo alemão como alavancas.
EM 30 DE DEZEMBRO DE 1929, A FUSÃO PROJETADA PELAS DUAS EMPRESAS COMEÇOU A VAZAR.
Você já pensou como transformaria sua vida caso despencasse do céu uma fortuna avaliada em quase quinhentos milhões de cruzeiros?
Ele manteve a calma, pois não tinha, ainda, a dimensão da sua riqueza. Seus pequenos sonhos poderiam ser realizados. O dinheiro era finito e a Varig a certeza de ser feliz, ao seu jeito.
Um gaúcho da Varig que virou personagem fantasma.
O felizardo era o Fidencio – Mas quem era o Fidencio? Onde andava o Fidencio, que não aparecia?
O privilegiado milionário seria um gaúcho da Varig, que ninguém conhecia e se mantinha na clandestinidade ( por ignorar que tinha ganho, perdido a cautela, ou somente uma chacota ?) O boato corria solto – O primeiro nome do felizardo era Fidencio. O resto uma grande incógnita. O Italo Mastrangelo, da Seção Pessoal, havia feito uma varredura e não encontrara nenhum Fidencio, nem Florencio. ou coisa que o valha, na relação de funcionários. O assunto já estava caindo no esquecimento entrando no rol das piadas, quando, por acaso, a personagem fantasma deu as caras.
Certo dia recebi um pedido do colega Ary Pezzutti, secretário da Fundação, solicitando uma matéria para a revista Rosa dos Ventos, dando cobertura ao setor de avicultura, procurando pelo Fidencio. Como é ? respondi atônito. É o nosso milionário.? É o próprio. Ary me falou rapidamente da situação. Que ele era funcionário há cinco anos da Fundação e assim que tomara conhecimento do cartão premiado veio pedir sua ajuda. -” Fizemos juntos os contatos com a Caixa, acertando o depósito numa conta em seu nome. E fiquei na obrigação de manter sigilo, (exceto ao presidente) Agora, ele resolvera se identificar mas somente para os amigos da Varig”.
Na Rosa dos Ventos, o segredo que emocionou colegas e o Brasil inteiro.
MILIONÁRIO DA ESPORTIVA
O colega Fidencio da Silva Chagas, funcionário de Fundação Ruben Berta como auxiliar de avicultura, onde trabalha há cinco anos, nunca entendeu de futebol. Jogou pela primeira vez na Loteria Esportiva, em setembro de1971. Com apenas uma aposta deu sorte – ganhou 480 milhões de cruzeiros. Antes de vir do segundo distrito de Tapes, o feliz acertador da Esportiva, trabalhava por conta própria em agricultura – “Senti um forte abalo quando soube do resultado. Agora vou comprar um terreninho, com uma casinha e um carro (bacana), diz ele.
Sua esposa, dona Délcia Barbosa Chagas, já esta até pensando no mobiliário do novo lar, muito entusiasmada e vai comprar uma boneca para a sua filha Maria Cleci, de cinco anos (que tenha o seu tamanho) Uma das primeiras preocupações do seu Fidencio (agora já elevado a senhoria) é ir visitar seus pais e sogros ainda residentes em Tapes, e, mais tarde diz que vai ser possível “dar uma colher de chá para meus dois irmãos solteiros e quatro casados”,.
Homem simples, Fidencio afirma que pretende continuar trabalhando na Fundação, por mais algum tempo, e após uma licença de dois dias, já ia se dirigindo para o serviço.- “Tenho cinco anos de firma. Resido na casa que pertence a empresa”,. Apesar de ter ficado milionário, ele afirma que pretende manter o mesmo ritmo de vida, pelo menos por enquanto. Continuar jogando na Loteria Esportiva ? Ele acha que não, e decreta – ” A sorte vem apenas uma vez na vida.” Fidencio e sua família seguiram novos caminhos, felizes e longe de todos nós.
* A Loteria Esportiva Federal em vigor, havia sido instituída em 1969 pelo presidente Costa e Silva, em plena ditadura militar, garantindo: que agora “todo o brasileiro ia ter o direito de ficar rico.” .Em 1970 , vivendo a emoção da conquista da seleção brasileira de futebol no México, a Caixa Econômica Federal lançou o primeiro Concurso Teste. .O Juventude, de Caxias do Sul, abateu o Grêmio por 1×0 derrubando todos os prognósticos. Nasceu dai a figura da Zebrinha, apresentada por Leo Batista, da TV Globo, virando mascote do programa esportivo do Fantástico.. Quando o placar era improvável ela se manifestava – Olha eu aí. Deu zeebraaa.! Virou jargão na boca do povo…
Nesse ínterim a Máfia da Loteria Esportiva foi denunciada em 1982 pela revista Placar, desmascarando um esquema que envolvia atletas, dirigentes, árbitros e funcionários do Sport Press. O plano era fabricar “zebras” que favoreciam empresários e grupos importantes do pais. deixando de ser comercializado em 1989,sendo substituída pela Loteca, em fevereiro de 2002.
O RASANTE QUE TENTOU DERRUBAR O PESCADOR CHAMADO BERTA
Eu era ainda guri, veraneava com meus pais na casa do Seu Berta, em Imbé. Ele trazia nas mãos àquelas botas de corpo inteiro para pescaria, parecia um zorrilho enfurecido e me disse.- “Entra no carro guri (eu devia ter uns 8 anos na ocasião) E lá fomos no Mercedes preto dele para a praia de Tramandaí , onde tinha uma Estação de Rádio . (Se não me engano tinha já na época um Radio Farol). Ele parou o carro, pulou para fora e quase engolindo o microfone, esbravejava com alguém. Só entendi o fim da conversa, quando ele afirmava colérico – “Então manda demitir o Binz” Depois voltamos para casa no Imbé, tudo calmo e tranquilo.
Na continuação da história, anos depois, lendo o livro -“”Assim se Voava Antigamente” escrito por Lili Lucas de Souza Pinto, comandante histórico da Varig, tomei conhecimento de que o interlocutor com quem Berta espumava de raiva, era o próprio autor do livro – que naquele dia estava de plantão no Centro de Controle de Voo. No texto ele dá sua versão de como ocorreu o episódio – “Num domingo o telefone tocou no CCV,. Do outro lado da linha a voz disse: Aqui é o Berta, quem. está no comando do PP-VBF? Pinto respondeu que o Douglas C-47, cargueiro, estava vindo de São Paulo sob o comando do Binz e perguntou qual o motivo da indagação. Não interessa! Pôe o Binz na rua, esbravejou, e desligou batendo com o telefone.. Quando o avião pousou, Pinto foi ao encontro do piloto para saber o que havia ocorrido. A única coisa diferente durante o divertido voo foi uma brincadeira patrocinada pelo comandante que confessou estar voando junto ao litoral quando resolveu dar um susto num homem solitário que sobre uma pedra pescava. Com o cargueiro vazio Binz deu um rasante sobre o cara. obrigando o pescador a se jogar no mar, Não foi difícil para Binz concluir que o pescador , desgraçadamente, era o seu Berta.
Na segunda feira,. já se considerando demitido, Binz foi chamado na sala da presidência. Começou a dar sua versão quando foi interrompido pelo Berta, que abreviou o assunto – Já tomei conhecimento de tudo Essa bobagem vai ficar registrada no seu currículo. Meio bronqueando, meio sorrindo, Berta sentenciou o comandante a nunca mais repetir a proeza (ele baixou a guarda atendendo súplica do Souza Pinto garantindo que tratava-se de um excelente piloto com grande futuro na empresa.)
No entanto, como testemunha dos fatos, posso contrariar a versão corrente de que tenha se atirado na agua, apavorado com o rasante. Ao contrário, permaneceu imóvel,. vislumbrou o avião como sendo Varig, fazendo um gesto de defesa baixando a cabeça e permanecendo incrédulo, por algum tempo, arrasado com o procedimento absurdo do seu piloto, contrariando todas as regras e procedimentos para o qual fora exaustivamente treinado.
O comandante Binz, faleceu aos 90 anos, em 1917. Fez grande carreira na Varig, Ganhou breve em 1948, tendo ao longo de 40 anos completado 33 mil horas voadas Pilotou desde o DC-3 até os grandes jatos da companhia, como o Caravelle , Boeing -707, DC-10 e o Boeing – 747 (Jumbo).Foi piloto do voo pioneiro sem escalas entre o Rio de Janeiro e Paris, realizado num Boeing -707, em 1967, portanto meio século atrás.
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* Luiz Fernando Smidt
Engenheiro e professor universitário, com formação acadêmica na Cornell University. Foi Superintendente e diretor de obras do grupo Varig – Companhia Tropical de Hotéis, por 13 anos ( 1980/1993) atuando na construção, ampliação e reformas no hotéis da Rede, sendo um estudioso da história da Varig.
O fato incrível de nunca ter sido mencionada a verdadeira razão das novas admissões ( por ele mesmo autorizadas) feitas dentro de um plano estratégico para atender a demanda dos três modernos “Super Constellation,” preocupou o grupo. Serviu para demonstrar o “stress” vivido pelo presidente, no conturbado episódio quando até a vinda das modernas máquinas chegou a ser questionada.
Um alerta de Berta – “A Varig não é uma artificialidade econômica. Não vai soçobrar neste processo se todos tiverem a cabeça no lugar “.
Na véspera da expansão internacional, Berta dá um alerta sobre os problemas do setor, numa carta estritamente confidencial endereçada aos seus diretores. Ele sempre falava em prejuízo da Varig e das dificuldades vividas pela economia do país, que representavam uma situação nebulosa para a indústria. aeronáutica. No entanto. apesar dos maus presságios, continuava adquirindo novos equipamentos. Modernizar a frota era uma forma de investimento que ele considerava essencial para a sobrevivência e o crescimento da companhia. Mesmo sem ter dinheiro vivo Berta usava o bom comportamento da empresa no pagamento dos compromissos assumidos, tendo como aval os bens próprios. Assim, eram negociados polpudos empréstimos junto a banqueiros de Nova York e Tóquio, com contratos facilitados pelos fabricantes.
Na verdade Berta pouco lidava com capital da empresa. Ele se preocupava em manter as subvenções dentro dos padrões estabelecidos, reduzindo gastos e aplicando os bons resultados na qualidade dos seus técnicos e na excelência da sua infraestrutura operacional.
Com a morte de Vargas, em 54, o Brasil passou a viver momentos de crise, causando a queda repentina de preços, suspensão de pagamentos, falta de trabalho e capital. A Varig que se encontrava às vésperas da tão sonhada expansão internacional necessitava se organizar urgentemente. Era uma exceção no caos que o país vivia. E Berta sabia muito bem de todos os riscos que corria. No dia 02 de dezembro de 54, quando se preparava para fazer o relatório final que seria apresentado na reunião do Colégio Deliberante da Fundação, antecipou-se, enviando uma carta “Estritamente Confidencia” aos seus diretores. Em vez de mandar uma mensagem de otimismo, como era de se esperar, preferiu a verdade contundente, levantando dúvidas e incertezas sobre a conjuntura da economia brasileira, comentando a situação da Varig neste contexto.
O documento sigiloso fazia parte dos arquivos secretos de Meyer, postos a minha disposição quando da elaboração do livro- Berta os anos dourados da Varig. Nele, Berta aponta as razões do aumento de funcionários, quando todos encolhiam. Falava das medidas corretivas em função da pasmaria das negociações, rumo à crise que se avizinhava, garantindo que a expansão interna fora excessiva nos seus últimos doze meses ( justamente à época que fui admitido na Varig – ou seja, ingressei na empresa por um aborto) Pedia a maior eficiência interna dos serviços, que não aumentaram ultimamente, exceto na manipulação de carga. E reclamava – ” Em lugar de introduzirmos novos métodos de trabalho o que fazemos foi simplesmente aumentar o número de funcionários, muitas vezes mais do que a realidade normal.
O que todos precisam compreender é que governar e dirigir a Varig torna-se cada vez mais um problema de proficiência econômica, o que é um encargo direto da presidência. mas deve ser auxiliado por todos os chefes de serviço, sob pena de graves contratempos. A diretoria é nesse ponto, um conjunto de pessoas atuar no mesmo sentido. Fiel ao pensamento expresso no organograma da companhia de que o melhor governo é sempre àquele em que se centraliza o planejamento das coisas, mas descentraliza a sua atuação. Temos dado a maior autonomia aos nossos departamentos e instituindo na Varig o governo colegiado. Berta aproveitou para tocar num assunto fundamental dentro da sua concepção de liderança e domínio da situação – coisa que ele nunca abriu mão -“A possibilidade de decidir em grupo, com liberdade de expressão obriga todos a pensar no problema conjunto da companhia e não somente no seu departamento.. A alternativa é a ditadura, que todos , em tese , detestamos,” decretava o presidente.
No documento Berta ainda garantia – “Nosso equilíbrio não depende, evidentemente, apenas no corte de despesas, mas também no aumento de receita, que se desenvolvia agora de um modo promissor através dos Correios, que nos cabe por lei. A carga está em grave crise trabalhando à menos da metade. ´E importante a receita das passagens que deve melhorar para o fim do ano. No final, ensinava:-” Governo não dá indícios de modificar sua política econômica e financeira, o que não é um bom indicativo. A Varig não é uma artificialidade econômica, Não vai soçobrar nesse processo se todos tiverem a cabeça no lugar