FILHOS BASTARDOS (1/2)
INICIALMENTE, PARA O PESSOAL DA VARIG, QUEM VINHA DA REAL ERA CONSIDERADO FILHO BASTARDO (CONCEBIDO FORA DO CASAMENTO)
QUEBRAR ESSE TABU REPRESENTAVA MISSÃO INGLÓRIA PARA BERTA E LHE TIRAVA HORAS DE SONO ( ELE JÁ ERA INSONE POR NATUREZA)
As máquinas se ajustavam com perfeição – mas as pessoas não eram máquinas.
No episódio da compra da Real, a Varig tornou-se a única companhia aérea brasileira a dominar o mercado nacional, onde a Real dominava, num “avanço desmesurado, ainda fora de tempo” capaz de causar alguma dificuldade no manejo dos negócios- enfim, estava-se invertendo o adágio popular -” O menor engole o maior.”
Berta não queria, querendo. A aquisição desordenada de uma empresa de grande porte – a beira da morte – representava figura capenga do menor engolindo o maior, obrigando Berta a fazer “das tripas o coração” Na enorme operação que transformou a Varig regional em gigante, muita água rolou pela ponte, novela escrita em capítulos históricos, digno de romance, que eu iria acompanhar de perto.
Fora admitido na Varig em julho de 54, já vivendo a experiência do suicídio de Vargas e quanto tudo isso representava para a Varig. Em 1958, tendo Berta com pulso de ferro defendendo os interesses da Varig, segui de perto o desfecho de uma refrega entre dois gigantes da nossa aviação comercial – o líder da Varig, rebatendo ataques recebidos de Lineu Gomes, tendo frase lapidar de repercussão na mídia – ” Nem as dificuldades, nem malícia, porém, conseguiram acorcundar a Varig (em alusão ao concurdinha símbolo da Real) que manteve o Ícaro (símbolo da Varig) de peito ao vento e de cabeça erguida, bem representando o espirito da companhia e caráter dos seus homens”.
Em 31 de dezembro de 1961, Berta fez uma declaração histórica perante os membros do Colégio Deliberante da Fundação, esclarecendo em detalhes e oficialmente, o episódio da compra da Real: “Atendendo a um apelo do ex-presidente Jânio Quadros, entrou a Varig em entendimentos com suas congêneres internacionais no sentido de um maior entrosamento das linhas exteriores, do que resultou primeiro na compra de 50 % das ações da Aerovias Brasília e mais tarde a aquisição do Consórcio Real. através da Fundação. Assim, a cargo da Varig,ficaram cerca da metade do volume dos transportes domésticos e cerca de 60% do volume das linhas internacionais brasileiras. No discurso de 62, afirmava Berta- “terá de ser reestruturado esse enorme organismo que tem linhas desde a América do Sul, para vários pontos dos Estados Unidos até a Ásia e no qual funcionam cerca de 100 aviões e trabalham mais de 10 mil funcionários”.
Segundo Berta, a Fundação intervirá no assunto através do controle de 50% das ações da Varig. “O empenho em que a Fundação terá que se esmerar nos próximos anos, será o de criar serviços substanciais dentro da organização da Real, cujo funcionalismo deve vir a gozar dos mesmos benefícios que atingem o pessoal da nossa empresa”. Berta tornava público, pela primeira vez, a revelação de um fato que lhe trazia enorme aflição, capaz de envolver a Varig num beco sem saída” Como se daria a absorção de um contingente tão volumoso, heterogênico, desgastado por constantes mazelas internas, reforçadas por discussões públicas entre seus líderes, incluindo dificuldades no âmbito trabalhista. Eram detalhes que se bateriam com o espírito disciplinado, obreiro, do seu pessoal – e até que ponto a Fundação seria atingida na difícil missão de distribuir para os” filhos bastardos” as mesmas benesses, oriundas de vida sem atribulações, garantindo, até então, continuidade de uma existência incapaz de empobrecer a raiz ?