BERTA X COMANDANTES

BERTA X COMANDANTES

NUVENS NEGRAS NOS CÉUS DA GRANDE FAMILIA VARIG

Berta e os Comandantes – momentos nebulosos na história da Varig

A Grande Família Varig vista por todos como espelho de união, congraçamento e felicidade entre seus membros, volta e meia mostrava o outro lado da moeda (sempre com os comandantes) num embate que virou rotina envolvendo a personalidade egocêntrica de Berta e a obstinação dos comandantes, na busca do protagonismo que lhes era negado quanto à indicação para membro do Colégio Deliberante da Fundação dos Funcionários – com força para definir posições políticas estratégicas, que avançavam até a escolha do próprio presidente da Varig. Nem sempre a família Varig viveu em céu de brigadeiro. Quando fui admitido em julho de 1954, a empresa estava saindo de uma crise interna que deixaria sérias sequelas. Envolvia um grupo rebelde de comandantes, justamente considerados por Berta as figuras mais importantes no planejamento estratégico que se preparava para assumir, pela primeira vez, as responsabilidades de uma rota internacional de longo alcance, na conquista de Nova York.

Comandantes trocaram a Fundação pelo Sindicato – Com o Super Constellation veio o perdão – restou uma ferida jamais cicatrizada.

Na carta de 51, altamente reveladora e sintomática, Berta abordou de frente assuntos até então considerados tabu. Foi nessa época que alguns funcionários do topo da pirâmide, na sua maioria comandantes, rebelaram-se contra a liderança exercida pelo seu presidente. A desavença ultrapassou os limites da chamada “economia interna” chegando ao conhecimento público. Os pilotos, insatisfeitos com algumas atitudes de Berta, resolveram sair da Fundação dos Funcionários, passando a apoiar o sindicato de classe. Era uma atitude que Berta não acatava, de maneira alguma, sendo intransigente nesse quesito. Os “reacionários”, como chamava, eram, na opinião dele, verdadeiras laranjas estragadas, retiradas do cesto para não contaminarem aquelas que estivessem ao seu lado. Foi um processo inusitado com enfrentamento considerado “insurreição” por Berta, incompatível com os conceitos socializantes, com gesto que ele definia como traição.

Com o Boeing-707, na era do jato, nova arremetida de um grupo de comandantes elege Bordini como vice- presidente da Fundação dos Funcionários
(e da Varig) dando protagonismo aos comandantes, reforçando queda de braço que se tronava histórica

Integrados ao Sindicato, os tripulantes passaram a rezar pela mesma cartilha das greves e manifestações públicas, coisa que Berta não aceitava como solução dos impasses na época dos dissídios coletivos. Insatisfeitos com a forma autoritária de dirigir os destinos da empresa de maneira ditatorial, sem muita transparência, eles buscavam modificar os estatutos da Fundação. Somente em 1953 a contenda teve seu fim. Os comandantes voltaram para a Fundação, recebidos por Berta com palavras de reconciliação. Figuras como Erwin Wendorff, João Stepanski, Geraldo Knippling, Eduardo Maldonado,Waldemar Carta, Gastão Werlang, Hamildo Mancuso e Dario Lima Garahy, entre outros, tornaram-se verdadeiros ases da aviação comercial brasileira, galgando na Varig os maiores postos de comando.

A posse aconteceu no mesmo dia, tendo Bordini ocupado a mesa dos trabalhos ao lado do presidente.

Berta tinha insônia. Seguidamente tirava dona Wilma do sono da madrugada para fazer sanduiches que ele levava ao pessoal no hangar, preparando o Constellation para a grande escalada, rumo a Nova York. Mas a tripulação, excelente pelo desempenho, volta e meia chocava-se com a carranca do presidente. Era um convívio difícil de harmonizar. A entrada do jato (Boeing-707) de grande porte, transportando centenas de passageiros, fez o governo estabelecer parâmetros de atuação buscando a segurança do voo, definindo atribuições ao comandante com autonomia absoluta nas decisões de bordo. O presidente deixava de ser o mandante número um, transformando-se num passageiro comum, incapaz de levantar a voz numa decisão funcional restrita a bordo, daquele que era seu subordinado em terra. Estava armado o conflito.

A Varig crescia e necessitava qualificar o seu pessoal, já que mão- de- obra específica não existia, precisava ser incrementada. Nasceu então a Diretoria de Ensino, e com ela alguns pontos de discórdia, quase sempre superados no âmbito interno pela habilidade do diretor em contornar problemas, até que um dia o nó se desfez – Bordini deu asas a Investigação de Acidentes – revolução dentro de casa. A culpa era contabilizada na falha da máquina (mal operada?) Berta analisava os maiores acidentes no mundo e garantia que a estatística mostrava (incluindo a Varig) que o erro humano liderava essa pesquisa – coisa que a tripulação técnica desaprovava com veemência. Nasceu daí a APVAR (Associação de Pilotos da Varig) com objetivo de ter palavra oficial nas demandas dos pilotos. Certamente, mais um “quiprocó” que Berta teve de diluir, ampliando a área de debates. As controvérsias perderam cunho pessoal, amparadas por uma sigla forte.

Defendendo a criação da AEROBRAS, Melo Bastou, (líder sindical e tripulante da Varig (comandante) foi demitido por Berta sem medir as consequências.

A demissão do comandante Melo Bastos pela diretoria da Varig, em virtude da carta de apoio enviada à revista PN no tocante as denúncias baseadas na Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o estado caótico da aviação comercial brasileira, (onde a Varig nunca foi citada) propugnava pela implementação da AEROBRAS, resultando na demissão por justa causa do piloto, feita em maio de 1963, gerando uma greve de protesto dos servidores aeronautas, aeroviários, portuários e outros, trazendo problemas para o primeiro plano do interesse do governo e da opinião pública. Foi uma briga que custou caro para a Varig, com repercussão negativa que expos a existência de confrontos internos da Pioneira, com ambiente de enfrentamento entre capital e trabalho nunca revelados. Eram sequelas mostrando feridas trazidas ao conhecimento público, tendo Berta sido obrigado pela Justiça do Trabalho, a readmitir o funcionário, considerando sua situação de sindicalista atuante. Ele voltou, mas ficou excluído da escala de voo.

Na época, em 1960, quando a Varig dava um salto fantástico com a aquisição dos modernos Boeing-707, um grupo formado por comandantes insistia que Rubens Bordini colocasse ,seu nome para disputar com Berta, na reunião do Colégio Deliberante, a posição de presidente da Fundação – em última análise, presidente da Varig. Pela primeira vez, na história da empresa, um grupo dissidente indicava um candidato para enfrentar Berta nas urnas. Como era de se esperar Berta venceu as eleições, tendo seu opositor alcançado boa quantidade de votos ficando então como vice-presidente, cargo que até então não existia.

Bordini, credenciava-se com trabalhos relevantes – Ajudou a resolver o imbroglio do Electra com a Lockheed, trazendo o PP-VJM de fábrica. Na visão de Berta, Bordini passou a ser uma sombra em seu caminho. Séria altercação (1964) entre ambos resultou em enfarto sofrido pelo presidente, que considerava Bordini um traidor no episódio das últimas eleições. Dois anos depois,(1966) Berta faleceu vítima do mesmo mal

Lá por 1964, o comandante Rubens Bordini teve um desentendimento com Ruben Berta, no qual ele acusava de ter sido traído na eleição de presidente da Fundação. Dessa altercação resultou um enfarte em Berta – o mesmo mal que lhe causaria a morte dois anos depois, em plena mesa de trabalho, quando indicava seu sucessor (Erik de Carvalho) Berta nunca perdoou o envolvimento de Bordini, a quem tinha na conta de um dos seus mais leais e dedicados colaboradores, digno de extrema confiança. Provavelmente, o episódio com Bordini tenha sido o sinal que Berta entendeu, mas não teve tempo de evitar o mal que lhe tirou a vida para continuar na caminhada vitoriosa entre o céu e a terra, deixando a semente da Varig pronta para brotar e ser germinada com sua marca de vencedor.

Erik de Carvalho, pupilo de Berta, assumiu a presidência da Varig, com excelente desempenho.
Comments are closed.